Por Marco Pontes (*)
A Lei Complementar n. 213, que regulamenta as associações de proteção veicular, sancionada em janeiro pelo presidente da República e publicada no Diário Oficial da União em dia 16 de janeiro de 2025, promete revolucionar o mercado de proteção veicular no Brasil. A lei permitirá que as cooperativas de seguro operem em todos os ramos de seguros privados, com exceção daqueles expressamente vedados. A lei regulamenta as operações de proteção patrimonial mutualista e estabelece regras específicas para as cooperativas de seguros, entre outros pontos.
Na prática a lei traz inúmeros benefícios, tais como: reduz a insegurança jurídica, oferta maior proteção aos contratantes dessa modalidade de seguro e soluciona uma das principais críticas ao sistema, a ausência de legislação para o segmento ou a inexistência de um mercado sem a devida fiscalização. Portanto, como vemos, a nova lei contribuirá de forma inequívoca para aumentar de maneira significativa a frota de veículos segurada no país, que, apesar de grandes esforços feitos pelo mercado tradicional de seguros, não decola.
São inúmeras as razões pelas quais não decola. Ainda que o seguro de carro seja uma das maiores preocupações do brasileiro, segundo dados oficiais, aproximadamente 70% dos carros no Brasil não têm seguro, isto é, um contingente populacional significativo não está protegido contra acidentes, colisão de veículos, falha mecânica, roubos e outros imprevistos, por exemplo, despesas hospitalares. Por que isso ocorre? Sem dúvida, é pelo alto custo do seguro no país, especialmente para a população mais jovem, que tem recorrido às associações veiculares para se proteger daquilo que parece inviável obter no mercado tradicional, seja pelo elevado grau de comprometimento da renda do brasileiro para as questões mais urgentes, seja pelo alto preço do seguro no Brasil para uma grande parcela da população. Portanto, a partir do marco regulatório de proteção veicular, abre-se uma excelente opção em termos de custos, não apenas para a população mais jovem, mas também para todos os públicos, haja vista a atratividade dessas entidades, que ofertam custos mais acessíveis.
Um estudo da EY, uma das maiores empresas de consultoria do mundo, revelou que o faturamento do setor em 2020 gerou entre R$ 7,1 a R$ 9,4 bilhões e que havia mais de 680 associações de proteção veicular em atividades no Brasil, com mais de 4,5 milhões de associados (consulte https://www.terra.com.br/noticias/dino/cresce-a-procura-por-protecao-veicular-no-pais,9f49ddac2299419461966e2b16ee422e5avgyu0k.html?utm_source=clipboard).
Convenhamos, são números significativos que, por si só, demonstram o quão importante e bem-vinda é a publicação do marco regulatório do setor, que emprega milhares de profissionais.
A Lei n. 213/2025 destaca que caberá ao Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) estabelecer as diretrizes para regulamentar o setor e à Superintendência de Seguros Privados (Susep), a fiscalização. Nota-se uma preocupação legítima das principais lideranças desse segmento de atividade quanto à normatização que terão que cumprir, pois dependendo do nível de exigência do CNSP e da Susep, a dose normativa poderá até inviabilizar o segmento.
A adoção do princípio de proporcionalidade para o segmento pode ser uma alternativa viável para uma melhor adaptação da indústria. O princípio de proporcionalidade, previsto em Solvência II busca tratar dentro dos limites da ética e justiça econômica “desigualmente os desiguais e igualmente os iguais”. Sob essa ótica, o setor poderia se ajustar de forma paulatina, de modo que o remédio não matasse o paciente. É preciso lembrar que esse segmento também é muito heterogêneo, da mesma forma que o mercado de seguros. Em termos práticos, o princípio se baseia no seguinte fato: se as entidades partissem da mesma posição de poder econômico, não teríamos problemas com o nível de exigência, porém não é o que acontece na prática. Não podemos esquecer que o modelo prudencial, apesar de ter trazido robustez ao mercado, mesmo com a adoção do princípio de proporcionalidade, não resolveu o problema da alta concentração do mercado de seguros. A concentração de mercado traz inúmeros efeitos colaterais indesejáveis, tais como o racionamento da oferta agregada de coberturas de seguros, como é o caso, e as péssimas opções disponíveis, salvo raríssimos casos, no mercado de previdência para a população.
(*) Marco Pontes é atuário, diretor técnico do Instituto Brasileiro de Atuária (IBA), eleito em 2022 e reeleito em 2024 com mandato até 2026, membro pleno do Actuarial Standard Committee da International Actuarial Association (IAA), membro associado do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e sócio-fundador da LGP Soluções Atuariais Ltda. LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/marco-pontes-1b338011/
(27.02.2025)