Recuperação Judicial – Impugnação de Crédito pela Recuperanda – Crédito Ilíquido – Não Inclusão da Seguradora no Rol de Credores.
Por Paulo Bezerra de Menezes Reiff (*)
(Em 28.05.2018)
A 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, em decisão proferida no julgamento do Agravo de Instrumento nº 2215035-89.2017.8.26.0000 (assim como em tantos outros julgados na mesma sessão), manteve decisão de primeira instância que rejeitou impugnação de crédito de empresas do Grupo OAS em que se pretendia a inclusão de alegado crédito ilíquido da seguradora, na classe de credora quirografária, tendo as decisões afastado a seguradora da relação de credores sujeitos à recuperação judicial.
Sustentaram as recuperandas que deveria haver a inclusão, no quadro geral de credores, de crédito da seguradora relativo à obrigação de garantia prevista em apólice de seguro garantia, ao argumento de que, embora ilíquido, o crédito seria existente e determinável antes mesmo do ajuizamento da recuperação judicial e que, por isso, deveria se sujeitar aos seus efeitos.
A decisão do Tribunal de Justiça afastou a pretensão e a linha de argumentação das recuperandas no sentido de que o só fato de ter havido a contratação do seguro com a previsão de obrigação de garantia, pela seguradora, na hipótese de inadimplemento das obrigações do tomador, já seria suficiente para que se reconhecesse a existência de crédito pela seguradora, ainda que ilíquido, com sua consequente submissão à recuperação judicial.
Assim como em outros casos que envolviam obrigação de garantia, como na hipótese de fiança, no caso concreto, o sinistro que pudesse ensejar a cobertura securitária e o pagamento de indenização pela seguradora não havia se caracterizado antes do pedido de recuperação.
Em bem fundamentada decisão, o Tribunal afastou a pretensão das recuperandas para entender que, sendo o objeto da apólice de seguro garantia o pagamento de indenização na hipótese de ocorrência de sinistro caracterizado pelos prejuízos decorrentes de eventual descumprimento, pelo tomador, das obrigações garantidas, o crédito da seguradora só passaria a existir com o pagamento da indenização, ocasião em que a seguradora sub-roga-se no direito do segurado perante o tomador, o que, na situação analisada, sequer chegou a acontecer, antes ou depois do pedido de recuperação judicial.
Nesse sentido, a mera contratação do seguro ou a celebração de qualquer outro contrato que preveja obrigação de garantia, antes do pedido de recuperação judicial, não importa automaticamente na existência de crédito ilíquido, que, por isso mesmo, não deve se sujeitar à recuperação judicial, contrariando a linha de argumentação adotada pelas recuperandas.
De fato, se por um lado não se nega que a seguradora assume a obrigação de garantir um interesse legítimo do segurado, também não se pode desconsiderar que o pagamento da indenização decorre do implemento do risco consistente na ocorrência do evento futuro e incerto que caracteriza a álea própria dos contratos de seguro. Importa em dizer que a seguradora pode receber o prêmio sem que haja a necessidade da contraprestação de indenizar se não houver o implemento do risco segurado.
Daí não se confundir a obrigação de garantir o interesse legítimo do segurado (que se constitui com a celebração do contrato de seguro) com o dever de prestação de pagar a indenização securitária consistente no direito de crédito que exsurge ao segurado (e não ao tomador) com a ocorrência do sinistro coberto pela apólice.
Esse entendimento ficou claro no parecer dado pela Procuradoria de Justiça no caso em comento, que, ao se referir ao art. 49 da Lei 11.101/05, afirmou que o dispositivo legal não diz respeito a contratos ou negócios jurídicos existentes à data do pedido de recuperação, mas sim a créditos existentes, ainda que não vencidos.
A decisão afasta a possibilidade de inclusão de seguradoras no rol de credores por crédito ilíquidos quando não tiver ocorrido o sinistro e, por isso, não tiver sido paga a indenização.
Além disso, definiu-se como marco temporal para submissão do crédito ao concurso de credores a data do pagamento da indenização pela seguradora, quando ela efetivamente se sub-roga nos direitos do segurado.
(*) Paulo Bezerra de Menezes Reiff é sócio do DR&A Advogados responsável pela área contenciosa.